Relação do Vírus Epstein-Barr no desenvolvimento do câncer de mama


09.03.23

Temas relacionados ao vírus Epstein-Barr (EBV) ganharam grande repercussão recentemente em mídias digitais e televisas, especialmente em relação à mononucleose infecciosa, principal doença desencadeada pelo vírus.

Toda essa movimentação acerca do assunto reascendeu debates e discussões científicas entre médicos e especialistas sobre as potenciais implicações que a infecção pelo EBV pode gerar para a saúde

Existem evidências que correlacionam a infecção pelo EBV com o desenvolvimento de outras doenças, como a esclerose múltipla. Recentes pesquisas indicam que o vírus poderia ser um possível fator causal em indivíduos que sejam geneticamente predispostos [1].

A infecção pelo EBV também tem sido associada ao desenvolvimento de certos tipos de câncer, como o carcinoma nasofaríngeo indiferenciado e linfomas. Além disso, dados epidemiológicos e experimentais propõem um papel do EBV em um subconjunto de câncer de mama [2].

 

Características do vírus Epstein-Barr

Dados epidemiológicos apontam que aproximadamente 90% da população mundial possa ser portadora do EBV, o que demonstra a alta circulação deste vírus. No entanto, a maioria dos casos é assintomática e não desenvolve sintomas de mononucleose infecciosa [2].

O EBV é um vírus envelopado composto por fita dupla de DNA com aproximadamente 172 kb de comprimento. Dois tipos de EBV foram identificados até o momento, EBV-1 e EBV-2, ambos bem adaptados e capazes de estabelecer latência em humanos, mais especificamente em linfócitos B de memória [3 - 5].

A infecção pelo EBV inicia-se com sua ligação a receptores de superfície celular do tipo CD21 em linfócitos B. Ocorre fusão com a membrana celular e liberação do nucleocapsídeo no interior da célula (citoplasma). O capsídeo é então transportado para o núcleo celular onde ocorrerá replicação lítica ou entrará em estado latência.Em caso de replicação, após a saída da membrana celular os vírions podem ser disseminados por meio de secreções nasofaríngeas [6 - 8].

 

Relação do EBV e a carcinogênese

O EBV foi o primeiro vírus humano descrito como oncogênico e classificado como cancerígeno classe I pela Agência Internacional de Pesquisa sobre o Câncer (IARC) [9]. Estima-se que o EBV tenha sido associado a uma média 300 mil novos casos de câncer e mais de 150 mil mortes por câncer em todo o mundo em 2020 [10].

Dois tumores epiteliais têm sido associados à infecção por EBV: carcinoma nasofaríngeo indiferenciado, que abriga o vírus na maioria dos casos e câncer gástrico em quase 10% dos casos. [10].

Nos últimos anos, o EBV também foi associado a cânceres como linfoma extranodal de células NK/T e subgrupos de linfoma difuso de grandes células B. Além disso, o EBV está fortemente ligado a malignidades, como linfoma de Burkitt, linfoma de Hodgkin e linfoma de células T [10].

 

Evidências científicas do papel do EBV no câncer de mama

Estudos científicos sugerem que infecções virais poderiam estar associadas à patogênese do câncer de mama, uma vez que algumas sequências virais foram encontradas neste tipo de câncer em humanos [11].

Com relação ao EBV, estudos já detectaram a presença do vírus em tumores de mama, inclusive apresentando coinfecções com o HPV, indicando a possibilidade de interações entre os patógenos e o câncer [12].

Em um estudo científico que avaliou 48 casos cânceres de mama por meio de diversas técnicas, dentre elas hibridização in situ (ISH), foi possível detectar a presença de transcritos EBER, os quais são abundantemente expressos e concentrados nos núcleos de células infectadas pelo EBV [13].

Ao todo foram detectados os transcritos EBER-1 em 5/48 amostras (em torno de 10%) pela técnica de ISH. Além disso, foi encontrada uma correlação positiva entre a positividade do EBER-ISH e as características clínico-patológicas. Dentre os cânceres analisados, a maioria foi classificada como triplo negativo (56,5%), sugerindo um pior prognóstico nesses pacientes [13].

Em outro estudo semelhante, o sinal EBER foi identificado em 27% das amostras analisadas de câncer de mama. Ao estudar apenas os tecidos positivos para EBER, os pesquisadores constataram que 35% destes foram positivos para o EBV (não somente para o transcrito EBER), indicando a presença do genoma viral dentro das células tumorais [14].

Por fim, um estudo recente identificou a presença de EBV em 6,7% (4/59) das pacientes diagnosticadas com carcinoma de mama, enquanto todas as amostras controle foram negativas. Além disso, todos os casos positivos para EBV eram de alto grau tumoral (II e III) [15].

Em resumo, este compilado de resultados científicos sugere que a possitividade para EBV possa ser um fator de risco aumentado para o desenvolvimento de câncer de mama. No entanto, os mecanismos patofisiológicos envolvidos por trás destes achados ainda permanecem obscuros.

Estudos adicionais são necessários para identificar os mecanismos pelos quais o EBV pode estar relacionado ao câncer de mama, com potencial impacto nas estratégias de prevenção ou tratamento. O conhecimento do papel do EBV nesse tipo de câncer poderá contribuir para o estabelecimento de estratégias de prevenção, detecção precoce e controle da doença.

 

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Referências:

[1] Soldan, S.S., Lieberman, P.M. Epstein–Barr virus and multiple sclerosis. Nat Rev Microbiol 21, 51–64 (2023). https://www.nature.com/articles/s41579-022-00770-5

[2] Young L., Yap L.-F., Murray P.G. Epstein-Barr virus: More than 50 years old and still providing surprises. Nat. Rev. Cancer. 2016; 16:789–802. doi: 10.1038/nrc.2016.92.

[3] Lipman M., Andrews L., Niederman J., Miller G. Direct Visualization of Enveloped Epstein-Barr Herpesvirus in Throat Washing with Leukocyte-Transforming Activity. J. Infect. Dis. 1975; 132:520–523.

[4] Sample J., Young L., Martin B., Chatman T., Kieff E., Rickinson A. Epstein-Barr virus types 1 and 2 differ in their EBNA-3A, EBNA-3B, and EBNA-3C genes. J. Virol. 1990; 64:4084–4092.

[5] Miyashita E.M., Yang B., Babcock G.J., Thorley-Lawson D.A. Identification of the site of Epstein-Barr virus persistence in vivo as a resting B cell. J. Virol. 1997; 71:4882–4891.

[6] Lemon S.M., Hutt L.M., Shaw J.E., Li J.-L.H., Pagano J.S. Replication of EBV in epithelial cells during infectious mononucleosis. Nature. 1977; 268:268–270.

[7] Sixbey J.W., Nedrud J.G., Raab-Traub N., Hanes R.A., Pagano J.S. Epstein-Barr Virus Replication in Oropharyngeal Epithelial Cells. N. Engl. J. Med. 1984; 310:1225–1230.

[8] Tanner J., Weis J., Fearon D., Whang Y., Kieff E. Epstein-barr virus gp350/220 binding to the B lymphocyte C3d receptor mediates adsorption, capping, and endocytosis. Cell. 1987; 50:203–213.

[9] IARC Working Group on the Evaluation of Carcinogenic Risks to Humans Epstein-Barr Virus and Kaposi’s Sarcoma Herpesvirus/Human Herpesvirus 8; Proceedings of the IARC Working Group on the Evaluation of Carcinogenic Risks to Humans; Lyon, France. 17–24 June, 1997; Lyon, France: International Agency for Research on Cancer; 1997. pp. 1–492.

[10] Wong Y., Meehan M.T., Burrows S.R., Doolan D.L., Miles J.J. Estimating the global burden of Epstein-Barr virus-related cancers. J. Cancer Res. Clin. Oncol. 2021; 148:31–46.

[11] Gannon O., Antonsson A., Bennett I., Saunders N. Viral infections and breast cancer—A current perspective. Cancer Lett. 2018; 420:182–189.

[12] Labrecque L.G., Barnes D.M., Fentiman I.S., Griffin B.E. Epstein-Barr virus in epithelial cell tumors: A breast cancer study. Cancer Res. 1995; 55:39–45.

[13] Pai T., Gupta S., Gurav M., Nag S., Shet T., Patil A., Desai S. Evidence for the association of Epstein-Barr Virus in breast cancer in Indian patients using in-situ hybridization technique. Breast J. 2018; 24:16–22.

[14] Fessahaye G., Elhassan A.M., Elamin E.M., Adam A.A.M., Ghebremedhin A., Ibrahim M.E. Association of Epstein-Barr virus and breast cancer in Eritrea. Infect. Agents Cancer. 2017; 12:62.

[15] Mofrad M.G., Kazeminezhad B., Faghihloo E. Prevalence of Epstein-Barr virus (EBV) in Iranian Breast Carcinoma Patients. Asian Pac. J. Cancer Prev. 2020; 21:133–137.

 

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